liberalização dos despedimentos
Ofensiva antilaboral<br>em França
Uma nova ofensiva foi desencadeada pelo governo francês com a apresentação de um projecto que aumenta o tempo máximo de trabalho e permite despedimentos sem justa causa.
Sindicatos denunciam recuo histórico dos direitos
A reforma da legislação laboral anunciada pelo governo de Hollande-Valls significa «um retrocesso de cem anos», o regresso à época descrita em «O Germinal» ou noutros romances de Émile Zola.
Esta é pelo menos a avaliação dos sindicatos e sectores progressistas que lançaram de imediato uma petição na Internet intitulada «Lei do Trabalho: Não Obrigado!».
O anteprojecto saiu da tutela da ministra do Trabalho, Myriam El Khomri, e será apresentado na sua versão final em Conselho de Ministros, no próximo dia 9.
Alertando para a urgência da mobilização contra a perigosa reforma laboral, nove estruturas sindicais (CGT, CFDT, CFE-CGC, FSU, Solidaires-Sud, Unsa, Unef, UNL e Fidl) subscreveram, dia 23 de Fevereiro, um comunicado comum em que manifestam a sua oposição aos principais objectivos da lei.
Em 53 artigos, sete capítulos e 131 páginas, o governo socialista propõe-se arrasar conquistas históricas, algumas delas já bastantes fragilizadas, como é o caso do horário das 35 horas.
As alterações propostas visam anular na prática este limite geral da jornada semanal de trabalho. A jornada diária máxima passaria de 10 para 12 horas e de 46 para 48 horas semanais, permitindo ao patronato evitar o pagamento de horas extraordinárias, mediante a modulação do tempo de trabalho, calculado num período de três anos.
Os acordos de empresa passariam a prevalecer sobre as garantias fixadas na legislação e sobre as convenções colectivas sectoriais.
Para impor as suas condições, o patronato poderia realizar «referendos» em cada empresa, contornando assim qualquer processo negocial com os representantes dos trabalhadores.
Autorização para despedir
Por outro lado, o projecto prevê a liberalização e embaratecimento dos despedimentos sem justa causa.
Em caso de despedimento abusivo, as indemnizações teriam um tecto de 15 meses de salário, privando o trabalhador da possibilidade de reparação integral dos danos causados. Por outras palavras, a nova lei pretende «autorizar os despedimentos sem justa causa».
Também os despedimentos por razões económicas veriam o seu enquadramento legal alargado, permitindo-se o recurso a esta figura mesmo quando as empresas não atravessam dificuldades económicas sérias.
O governo Holande-Valls justifica as alterações com a necessidade de combater o desemprego, ao que os sindicatos respondem que nunca a desregulamentação laboral contribuiu para a criação de emprego, antes pelo contrário.
O retrógrado projecto terá sido a «gota de água» que desencadeou a mais recente vaga de críticas no interior do próprio Partido Socialista.
Na semana passada, a denominada «ala esquerda» do PSF divulgou um manifesto contra a política do presidente François Hollande e do seu primeiro-ministro, Manuel Valls, acusando-os de se desviarem dos valores da esquerda.
«Demais é demais!», sublinha o texto assinado por conhecidas personalidades do partido, nomeadamente Martine Aubry, filha de Jacques Delors.
Os signatários criticam a redução dos impostos às empresas, «41 mil milhões de euros mobilizados para nada» e o «desolador debate sobre a retirada da nacionalidade» aos franceses acusados de actos de terrorismo.
Como referia o L´Humanité, na sua edição de dia 25, «está consumada em definitivo uma forma de divórcio entre Hollande e a sua esquerda, incluindo a socialista».